29 fevereiro 2012

Duas meras anedotas ou dois ensinamentos cristãos?


Num cursilho de homens dos Açores, ocorrido há algum tempo atrás, um dos novos cursilhistas contou 2 anedotas, as quais, na altura e no meu modesto entender beiravam o ridículo/cúmulo, mas que tinham alguma graça, bem lá no fundo.
Uma delas contava “a história sobre um sonho que uma criança tinha tido e que pela manhã ao pequeno-almoço resolveu partilhar com os pais. Dizia ele aos pais, muito pausadamente e com uma dicção digna de registo, que no seu sonho era proprietário de uma prancha de surf amarela. Assim, pedia encarecidamente ao pai que lhe concretizasse o sonho com a compra da dita prancha amarela. Após um curto silêncio, ainda que para a criança possa ter sido uma eternidade, o pai respondeu-lhe:
- Vou-te oferecer um pente.”
A outra anedota, por sinal mais curta e concisa, “tinha a ver com 2 grãos de areia que estavam a apanhar sol numa praia deserta. Passado algum tempo repararam numa nuvem de grãos de areia que se aproximava a alta velocidade e resolveram fugir.”

Após pensar um pouco sobre elas, dei-me conta que o Espírito Santo sopra onde quer, ou seja, para além de terem sido contadas como anedotas, ambas traziam uma mensagem/ensinamento cristão. Ambas, ainda que aparentemente ridículas, ao entrarmos no fundo das mesmas, ambas têm muito sumo para se espremer e beber, senão vejamos:
- Quanto à primeira, quantas vezes não somos aquela criança que tem sonhos destes, isto é, “sonharmos acordados”, com desejos supérfluos e banais, quando o essencial Deus já nos deu.
- Quantas vezes pedimos-Lhe uma prancha de surf amarela e nem sequer sabemos nadar ou pôr-nos em pé na mesma.
- Quantas vezes Deus dá-nos “apenas” um pente, mas no entanto, é o que realmente precisamos é o que realmente nos faz falta já que, sem nos apercebermos, temos o cabelo todo despenteado e somente Ele se apercebe disso.

São inúmeras as alturas em que Lhe pedimos “mundos e fundos” e a resposta parece tardar em chegar, como se a distância entre nós e Ele fosse imensamente longa. A distância é imensamente pequena, diria sem exagero algum, quase microscópica porque, o tempo de Deus, ao contrário do que possamos pensar, não é igual ao nosso e, anos para nós poderão ser uma mera fracção de segundo para Ele.
Deus dá-nos sempre à medida das nossas necessidades, “nunca mais do que” ou “menos do que”, apenas o quando baste, e é nesse “quanto baste” que por vezes discordamos com Ele, ainda que pesamos pausadamente e com a tal dicção digna de registo.
Quanto à segunda, dois grãos de areia numa praia deserta, seria um contra censo já que uma praia, ainda que deserta, tem milhões de grãos de areia e não apenas dois, no entanto, após alguma reflexão, julgo perceber que os “dois grãos de areia no meio de uma praia deserta” somos todos nós, aqueles que remamos contra a maré. Somos todos nós, aqueles que em nome de Cristo apregoamos a boa nova, e ainda que sejamos poucos (quais 2 grãos de areia) e estejamos a apanhar sol (estar na graça de Deus), não devemos, nem podemos fugir ao primeiro momento que vejamos uma nuvem a chegar (contradições e opiniões duvidosas referentes ao Evangelho). Afinal de contas Cristo, Aquele que seguimos, não arredou pé à maior nuvem de grãos de areia de todos os tempos e esteve sempre a “apanhar sol numa praia deserta” até ao derradeiro momento, ainda que por breves momentos, tenha-se sentido abandonado pelo Pai. Nessa altura, nesse momento e nesse instante, a praia estava quase deserta, apenas alguns grãos de areia permaneciam ao pé, aqueles poucos grãos que Lhe eram mais próximos, no entanto, tudo começou com esses poucos grãos.
Termino citando um pensamento de Madre Teresa de Calcutá, adaptado para a situação: “Podemos ser poucos grãos de areia, mas sem eles, a praia seria mais pequena”.