"Depois de ter descrito a vida do monge à escuta de Deus na cela ou no trabalho, vamos tratar agora, com a ajuda do Senhor, da Comunidade. A graça do Espírito Santo congrega aos solitários para formar uma comunhão no amor, a imagem da Igreja que é uma e se estende por todas as partes.
Quando nosso Pai São Bruno penetrou no deserto com seis colegas, seguia as impressões dos antigos monges, consagrados totalmente ao silêncio e à pobreza de espírito. Com tudo, esta graça própria de nossos primeiros Padres consistiu em introduzir naquela vida a Liturgia quotidiana, que, conservando a força da instituição eremítica, associasse-a mais expressamente ao cântico de louvor do que o Sumo Sacerdote, Cristo, transmitiu a sua Igreja. Esta peculiar Liturgia a conservamos como mais conforme à vida contemplativa e solitária.
Ao modo da sinaxis dos antigos monges, em nossa Liturgia ocupam o lugar mais eminente as vigílias da noite, seguidas imediatamente de Laudes, a Eucaristia celebrada conventualmente, e também as Vésperas. Para estes ofícios nos reunimos na igreja.
Quando nos congregamos para a Eucaristia, em Cristo presente e orante se consuma a unidade da família cartusiana. Esta comemoração do sacrifício do Senhor reúne cada dia a todos os monges do claustro e aos monges leigos que o desejem.
Ademais, os sacerdotes na solidão celebram a Eucaristia, juntamente com a Igreja; então a humilde oblação de sua vida no deserto é assumida em Cristo para a glória de Deus Pai.
No entanto, nos dias que se ajustam mais à vida comunitária, os monges podem concelebrar, unidos num mesmo sacerdócio.
A oração noturna é aquela na que, perseverando nas sentinelas divinas, esperamos a volta do Senhor, para que, quando chame, abramos-lhe ao instante. As Vésperas se celebram ao tempo em que o dia declina e convida às almas ao sábado espiritual.
As demais Horas canônicas da Liturgia as recitamos, segundo costume, na cela. Os Domingos e Solenidades, Terça, Sexta e Nona as cantamos no coro.
A Liturgia celebrada no segredo da cela se adapta à vida solitária, que é liberdade do alma, de tal maneira que possa harmonizar o mais possível com a inclinação do coração, ainda quando seja sempre um ato de nossa vida comunitária. Ao toque de sino, orando todos ao mesmo tempo, obtêm como resultado que toda a Casa seja um louvor da glória de Deus.
Enquanto celebram o Ofício divino, os monges se fazem voz e coração da mesma Igreja, que por meio deles oferece a Deus Pai, em Cristo culto de adoração, louvor e súplica, e pede humildemente perdão pelos pecados. Cargo de suma importância, que desempenham os monges, certamente através de toda sua vida, mas mais expressa e publicamente por meio da sagrada Liturgia.
Sendo ocupação do monge meditar assiduamente as Sagradas Escrituras, até que se convertam em algo próprio à pessoa, quando se nos apresentam pela Igreja na Sagrada Liturgia, acolhemo-las como pão de Cristo.
A Liturgia conventual se canta sempre. Nosso canto gregoriano, o qual sabemos que fomenta a interioridade e a sobriedade do espírito, é parte tradicional e sólida do patrimônio da Ordem.
Os monges do claustro estão obrigados ao Ofício divino segundo o descrevem nossos livros litúrgicos. A participação dos monges leigos na Liturgia pode realizar-se de vários modos; em qualquer caso, participam na oração pública da Igreja.
Além do Ofício divino, nossos Padres nos transmitiram o Ofício da bem-aventurada Virgem Maria, cada uma de cujas Horas costuma preceder à Hora correspondente do Ofício divino. Com essas preces se celebra a perene novidade do mistério pelo qual a bem-aventurada Virgem engendra espiritualmente a Cristo em nossos corações.
Já que o Senhor nos chamou para que representemos ante Ele a toda criatura, é necessário que intercedamos por todos : por nossos irmãos, familiares e benfeitores, e por todos os vivos e defuntos.
Frequentemente celebramos a Liturgia da reconciliação, perpétua Páscoa do Senhor, pela que nos renova a nós, pecadores, que procuramos seu rosto. Efetivamente, nossa vida espiritual depende da assídua diligente e pessoal prática do Sacramento da Penitência.
Porque nossa vocação consiste em estar sem interrupção em vela cerca de Deus, toda nossa vida se converte numa espécie de Liturgia que em certos tempos se faz mais patente, já seja que ofereçamos orações em nome e segundo os ritos da Igreja, ou bem que sigamos os impulsos do próprio coração. Mas não nos dividimos por esta diversidade, já que sempre exerce em nós sua sacerdócio o mesmo Senhor, orando no mesmo Espírito ao Pai. "
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