10 dezembro 2020

19 anos

 


 


Faz hoje 19 anos que me despedi da minha mãe de coração. Naquele momento algumas lagrimas teimavam em querer sair dos olhos, quais quedas de água, mas alguém se antecipou a mim. Naquele momento, de certa forma criei a barragem do Cabril e apenas saiu um pequeno fio de água, qual nascente do rio Zêzere. Foi um momento duro, mas ao mesmo tempo reconfortante, sabendo que minutos antes de receber a chamada da tua partida para o Pai, tinha tomado a decisão de ir visitar-te naquela semana. Quero crer que estavas à espera dessas minhas palavras, para te separares desse corpo que aqui te prendia, mesmo que não tivesses noção do teu estado.

Na altura achei prematura a tua partida, mas algum tempo depois, consegui admitir que foi melhor assim. Estavas sem saber que estavas. Ninguém quer que os nossos entes queridos partam, mas é a lei da vida. Como muitas pessoas dizem, temos que fazer o luto, contudo, é algo que até agora não fomos ensinados, Ainda não fomos ensinados para aceitar a única certeza que temos nesta passagem, e como tal, é emocionalmente duro ver alguém que gostamos, partir.

Não fiquei órfão, uma vez que a minha mãe de sangue ainda é viva, graças a Deus, no entanto, devido a vários fatores da vida, alheios à nossa vontade, tu é que estiveste sempre presente, quando a minha presença, algumas vezes, era ausência para alguns.

Mesmo residindo a meio do Atlântico, tiveste a coragem de me vires visitar em alturas marcantes da minha vida familiar e até conseguiste que o avô emprestado (como lhe chamo) viesse também.

Várias vezes na semana ligava-te, não só para ouvir a tua voz, mas também para conversar, desabafar, pedir uma opinião e tu também fazias o mesmo.

Creio que estejas perto de Deus e mesmo que ainda estejas à distância de mais algumas orações, sabes que contas comigo, mesmo que essas orações sejam apenas conversas com Deus.

 

 

Parece que foi há pouco tempo. Alguns dias, semanas, meses, mas faz 19 anos.

 

10 de dezembro de 2020

30 junho 2020

Ausência de brilho ocular


Ausência de brilho ocular




Quais copos de cristal puro e imaculado
refletindo a luz do Sol como sinal da Sua aliança,
assim são os nossos olhos.


Tal como o cristal dos copos se torna embaciado
depois de várias lavagens na máquina,
assim estão os seus olhos.


Olhos que outrora espalhavam brilho
como o gelo polar reflete a luz
Hoje encontram-se baços, turvos e opacos.


Semelhantes ao gelo polar ou ao cristal puro
esses olhos precisam de ser abrilhantados
para que possam novamente refletir
a luz do mundo e o sal da terra.




30 de junho de 2020

19 junho 2020

Partida antecipada




Quando nascemos a única certeza que temos é que não sabemos a hora ou o dia em que Ele nos irá chamar e ainda bem. No entanto e infelizmente, no mundo ocidental em que vivemos, ainda não fomos ensinados para essa certeza. Ainda é muito doloroso vivermos a partida de alguém que se ama, seja nova ou menos nova, mas se for nova ou forem os nossos filhos…

Filhos que se despedem da partida dos seus pais, ficam órfãos, mas e ao contrário? Ao contrário não há nome criado porque não é natural apesar de acontecer. Não é natural os pais enterrarem os filhos…
Nem sequer imagino a dor de um casal que depois de ver nascer o fruto do seu amor, pouco mais de 10 anos, vê-lo partir bruscamente sem nada puder fazer. Ver partir de um segundo para o outro alguém que vendia saúde até aquele momento. Alguém que com tão tenra idade ainda era uma criança inocente, ainda era um anjo de Deus no seio daquela família.


Não compreendemos os desígnios de Deus e numa situação assim, por vezes viramo-nos contra Ele e perguntamos-Lhe:
- Porquê ele e não eu?
E Ele nada nos diz ou aparentemente não O ouvimos.

Olha para os rostos dos familiares mais próximos e apesar de apáticos, sente-se uma dor atroz nos seus corações. Os olhos, espelhos da alma, estão completamente apagados, sem brilho algum, quase que embaciados, apesar das lágrimas já derramadas.

Durante a celebração, fiquei no lugar habitual. Lugar de onde vejo a Capela do Santíssimo Sacramento de um lado e do outro a imagem de Sua e nossa Mãe Maria Santíssima. Hoje e neste mesmo lugar, vejo a brancura do caixão e um pouco da cabeça daquele Anjo de Deus. Qual mãe que teve no seu ventre durante 9 meses e mais de 10 anos a cuidar dele, vejo-a de vez em quando a afagar os seus cabelos docemente e ternamente e outras vezes um carinho na face, qual Maria a fazer o mesmo ao Seu menino Jesus. O pai, qual José, apenas olhava e de quando em vez abraçava-a para a aconchegar do frio interior. A igreja, para a altura que estamos a atravessar, estava cheia de pessoas sentidas por esta partida antecipada. Quais pastores, olhavam para esta família, não pelo nascimento do menino Jesus, mas sim pela partida de um anjo d`Ele. Ao contrário de algumas cerimónias idênticas, esta primou por algum silêncio, talvez introspectivo, porque muitos de nós sendo pais naquele momento estaríamos a pensar “- E se fosse o meu?”

No cemitério o pai chorava timidamente e a mãe, que no momento que me cheguei mais perto dela derramava uma lágrima cheia de brilho e vida (qual estrela de Belém), queria ali ficar para sempre. A avó sabia que o seu neto estava junto a São Francisco e os seus irmãos animais. Já o avô aparentava estar conformado com esta partida e esperançoso com o regresso da neta


Não compreendemos os desígnios de Deus e numa situação assim, por vezes viramo-nos contra Ele e perguntamos-Lhe:
- Porquê ele e não eu?
E Ele nada nos diz ou aparentemente não O ouvimos.

Volto atrás algumas semanas e recordo-me do que me foi dito dois dias antes do fatídico acidente. O anjo de Deus, durante o baptizado da irmã naquele domingo, cumpriu todo o ritual tal e qual o padrinho da menina. Há quem diga que foi o destino a chamar, no entanto, quero acreditar ter sido apenas Deus a mostrar que o Seu anjo iria ser a Luz da sua irmã lá ao pé de Si. Que a sua missão aqui iria terminar brevemente e ao pé de Si era o lugar dele. Quero crer que ao pé do Pai, ele irá interceder pela sua irmã, para que ela recupere sem sequelas e possa iluminar a vida dos seus pais, avós e família mais chegada, já que cá em baixo, essas pessoas estão a passar uma escuridão imensa. Uma escuridão que abafa os corações, enegrece os olhos e tenta fechar os olhos da alma em relação ao Criador.

Sexta-feira, dia 19 de junho de 2020. Dia do Sagrado Coração de Jesus. Coincidências ou Deuscidências mas, a imagem venerada neste dia, já há alguns anos a esta parte que os arranjos florais na Sua capela são executados por esta família agora enlutada.

“Perdeu a vida, mas deu Vida em abundância” é o que me acorre dizer para terminar este desabafo, no qual afinal de contas, nada disse.

28 março 2020

Urbi et Orbi Extraordinária


Estamos perante uma imagem poderosíssima. Uma imagem que recordará sempre esta 6ª feira em que o Santo Padre, para além de uma homilia muito profunda, com a humildade que ele nos tem acostumado e a adoração do Santíssimo, proferiu a bênção Urbi et Orbi Extraordinária, para toda a humanidade, crentes e não crentes.

Esta imagem fez-me pensar um pouco, para não dizer muito, sobre o meu papel na sociedade, nos movimentos onde estou integrado, no local de trabalho e no seio da minha família.

Sim, o ser cristão, não é somente estar e ser onde estão e são, mas principalmente, onde não estão e não são. De que serve orar pelos que gostamos? Disse certa vez Jesus aos seus apóstolos. Orar assim era e é como os pagãos! Orar pelos que nos têm ofendido, por aqueles de que menos gostamos, isso sim é Amor. É difícil? É! Mas quantas mais vezes o fizermos, melhor o mundo estará, afinal de contas, a oração, seja de que forma for, sentida e meditada no âmago do coração, tem um poder enorme, que nem imaginamos, só Ele sabe.

Esta imagem, por coincidência, levou-me ao tempo litúrgico que há-de vir. Levou-me a outra 6ª feira, há 6ª feira Santa, na qual, depois de muitas multidões o seguirem nos dias anteriores, também Jesus ficou sozinho, tal como o Santo Padre. Bem sei que não foi pelo mesmo motivo e forma, mas ele ali chegou sozinho acompanhado por poucos, como O foi Jesus Cristo. Ele ali chegou carregando nos ombros o peso da Sua e nossa Cruz. Apesar de abatido, combalido e com uma tristeza enorme na sua alma, tenho a certeza que as nossas orações naquele momento particular e especial foram o seu Cireneu. Sozinho, mas com cada um de nós, que fazemos parte do Corpo Místico de Cristo, ele e Ele não estavam sós.
Por muito levianamente que possamos pensar, nestes dias o Maligno (sim ele existe verdadeiramente, por muito que alguns digam que não) tem-nos tentado, como tentou Jesus Cristo naqueles quarenta dias no deserto. Nós também, nesta Quaresma e por força deste vírus, também caminhamos no deserto. Também não sabemos para onde vamos, mas sabemos que é neste deserto silencioso e forçado que Ele nos falará, se O soubermos escutar.

Nestes dias o Maligno, ao ver os locais de culto despidos de crentes e ontem a praça maior deserta de pessoas, seguramente riu-se imenso, um rir maquiavélico, pensando que está no controle da situação e que sairá triunfador no fim. Esse ser maligno, esquece-se que os locais de culto e a praça maior, são apenas e somente locais simbólicos para os crentes. Locais é certo, que nos elevam para Ele, mas o mais importante são as almas fervorosas em oração, seja onde for que se encontrem. Também os primeiros cristãos se encontravam em catacumbas e não foi por isso que deixaram de acreditar n`Ele. Aliás, as catacumbas eram locais onde se colocavam os corpos dos mortos, mas nesses locais de encontro, partilha da palavra e oração entre os primeiros cristãos, Ele estava vivo, talvez mais vivo, atrevo-me a dizer, do que muitos de nós em enormes Basílicas. Talvez depois deste sábado do grande silêncio, todos nós crentes, deixemos de ser apenas cristãos mornos, mas sim de coração abrasado. Se assim for e acontecer, a cabeça da serpente será esmagada e despertaremos para o domingo da Ressurreição.

Esta imagem, no silêncio avassalador, está carregada de imensas palavras de perdão, agradecimento, esperança e louvor.

Nesta imagem o apascentador das Suas ovelhas, não estava só. Tinha todo o seu rebanho com ele, até a ovelha perdida ali se encontrava, juntamente com as outras noventa e nove.

21 setembro 2018

Oração



Desde a aurora da Tua existência
até ao Teu crepúsculo humano sigo-Te
confiando no dia em que não haverá mais noite.

Não me sinto apostolo porque peco muito...
por palavras, atos e omissões, no entanto,
peço à Virgem Maria que rogue por mim a Deus Nosso Senhor.

Sei que a Tua vinda não foi pelos justos, mas pelos doentes,
nem pelos que têm saúde, mas pelos pecadores,
e ser justo ou saudável, nada disso sou...

18 setembro 2018

Viático


Há algumas semanas na RTP Açores, transmitiram uma reportagem sobre a tela que dei o titulo, da autoria de Domingos Rebelo e que se encontra exposta no Museu Carlos Machado em Ponta Delgada.


A explanação que foi feita, muito elucidativa e interessante, tendo inclusivamente sido dito que o pintor sabia muito sobre o tema, isto é, as coisas presentes na tela, refletiam o que a igreja usava/usa nestas situações.


A dada altura focaram a imagem abaixo e pareceu-me que transmitia algo mais do que apenas o objeto em si, tendo em conta os conhecimentos que o pintor tinha.


Como não consegui encontrar na net esse detalhe, solicitei ao Museu a referida imagem, a qual desde já agradeço a partilha.

Depois de olhar com mais calma, reparei que efetivamente (para mim) esse detalhe transmitia mais do que apenas o objeto. Dei-me conta que o pintor deveria ser devoto de Nossa Senhora ou Deus assim O quis, uma vez que a chama da vela é uma representação nítida de Nossa Senhora de mãos postas em oração.


Depois de olhar mais uma vez, noto ainda mais um pormenor interessante. A lanterna para a vela tem 4 cantos, talvez uma maneira de mencionar os quatro evangelhos.


Obviamente que isto é o que os meus olhos veem, talvez outros não reparem.


17 de setembro de 2018