05 outubro 2010

3 -Os monges do claustro

"Os que foram Padres de nossa Religião seguiam a luz do oriente, a daqueles antigos monges que, quente ainda em seus corações a recordação do Sangue recém derramado pelo Senhor, encheram os desertos para dedicar-se à solidão e a pobreza de espírito. Portanto, os monges do claustro, que seguem este mesmo caminho, convém que vivam como eles em ermos suficientemente afastados de toda moradia humana, e em celas livres de todo ruído, tanto do mundo como da mesma Casa ; sobretudo, que permaneçam alheios aos rumores do século.

Quem persevera firme na cela e por ela é formado, tende a que todo o conjunto de sua vida se unifique e converta numa constante oração. Mas não poderá entrar neste repouso sem ter-se exercitado no esforço de duro combate, já pelas austeridades nas que se mantém por familiaridade com a cruz, já pelas visitas do Senhor mediante as quais o prova como ouro no crisol. Assim, purificado pela paciência, consolado e robustecido pela assídua meditação das Escrituras, e introduzido no profundo de seu coração pela graça do Espírito, poderá já não só servir a Deus, senão também unir-se a Ele.

Convém também ocupar-se em algum trabalho manual, não tanto por simples distração do ânimo, quanto para submeter o corpo à lei comum dos homens e conservar e fomentar o gosto pelos exercícios espirituais. Por isso se lhe concedem ao monge em sua cela os utensílios necessários, a fim de evitar que se veja forçado a sair dela; porque isto não lhe está nunca permitido, a não ser para as reuniões na igreja ou no claustro, e em outras ocasiões previstas pela regra. Agora bem, quanto mais austera é a senda que abraçamos, tanto mais estritamente nos obriga a pobreza em todas as coisas de nosso uso. Porque é necessário que sigamos o exemplo de Cristo pobre, se queremos participar de suas riquezas.

Unidos em comunidade pelo amor ao Senhor, a oração e o zelo pela solidão mostrem-se os monges do claustro como verdadeiros discípulos de Cristo, não tanto de palavra quanto de obra; amem-se mutuamente, tendo os mesmos sentimentos, suportando-se e perdoando-se se algum tem queixa contra outro, a fim de que com uma mesma voz honrem a Deus.

Mantenham também os padres em seu espírito o íntimo vínculo pelo qual estão unidos em Cristo com os irmãos. Reconheçam que dependem deles para poder oferecer ao Senhor uma oração pura na quietude e a solidão da cela. Recordem que o sacerdócio ao que foram elevados representa um serviço à Igreja principalmente nos membros mais próximos, isto é, os irmãos da própria Casa. Tendo-se mútua deferência, padres e irmãos vivam na caridade que é vínculo de perfeição e fundamento e cume de toda vida consagrada a Deus.

É próprio do Prior mostrar em si mesmo a todos seus filhos, monges do claustro e leigos, um signo vivo do amor do Pai celestial, e reuni-los em Cristo de tal maneira que formem uma família, e cada uma de nossas Casas seja realmente, segundo a expressão de Guigo, uma igreja cartusiana.

A qual tem sua raiz e fundamento na celebração do SacrifícioEucarístico, que é signo eficaz de unidade. É também o centro ecume de nossa vida, e ademais viático espiritual de nosso Êxodo, por onde na solidão retornamos por Cristo ao Pai. Assim mesmo, em todo o curso da Liturgia, Cristo como nosso Sacerdote ora por nós, e como Cabeça nossa ora em nós de maneira que nele possamos reconhecer nossas vozes, e em nós a sua.

Na vigília noturna, nosso Ofício se prolonga bastante, segundo antigo costume, ainda que guardando sempre uma discreta moderação. Assim se alimenta a devoção interna com a salmodia e se pode dar o tempo restante à oração calada do coração sem fastio nem cansaço.

Segundo antigo costume nossa, todo monge do claustro está destinado, por uma admirável graça da piedade divina, ao sagrado ministério do altar. De onde se manifesta nele essa harmonia que, como diz Pablo VI, existe entre a consagração monástica e a sacerdotal. A exemplo, pois, de Cristo, faz-se juntamente sacerdote e vítima, em cheiro de suavidade para Deus, e pela união no sacrifício do Senhor participa das riquezas insondáveis de seu coração.

Como nosso Instituto está ordenado inteiramente à contemplação, temos de guardar com toda fidelidade nossa separação do mundo. Estamos, por tanto, isentos de todo ministério pastoral, por muito que urja a necessidade do apostolado ativo, a fim de cumprir nossa própria missão dentro do Corpo Místico.

Mantenha Marta seu ministério, laudável certamente, ainda que não isento de inquietude e turvação; mas permita a sua irmã que, sentada junto aos pés do Senhor, dedique-se a contemplar que Ele é Deus, a purificar seu espírito, a adentrar-se na oração do coração, a escutar o que o Senhor lhe diga em seu interior; e assim possa agradar e ver um pouquinho, como num espelho e confusamente, como o Senhor é bom, enquanto roga por sua irmã e por todos os que se afanam como ela. Maria tem a seu favor não só ao mais imparcial dos juízes, senão também ao mais fiel dos advogados, ao mesmo Senhor, que não se limita a defender sua vocação, senão que faz seu elogio, dizendo: Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada. Desta maneira a escusou de misturar-se nos cuidados e desassossegos de Marta, por piedosos que fossem. "

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